Como disse na conversa anterior, por enquanto só estamos estabelecendo corrimões, amparos para aquele que quer vivenciar uma caminhada espiritualista. Por isso temos falado de temas genéricos. Já colocamos quatro corrimões e por isso agora já está na hora de entrarmos um pouquinho nas particularidades. Por este motivo, hoje vamos conversar de uma coisa mais específica. Esta conversa será importante, porque ela mostrará a prática de tudo aquilo que estamos falando nestas conversas.

O tema de hoje é agressão verbal.

Na última conversa falamos sobre relacionamentos humanos de uma forma genérica; hoje vamos falar especificamente de um destes relacionamentos: aqueles onde haja agressões verbais. Não vamos conversar sobre agressões físicas, mas apenas aquelas que são realizadas verbalmente.

Quando se fala em agressão verbal  é preciso aprofundar-se um pouco na compreensão do tema, porque vocês acham que a existência de uma agressão verbal  depende de uma intensidade determinada ou alguns tipos de palavras… Isso não é real.  Qualquer frase proferida que contenha ideias que sejam contrárias àquelas de quem está ouvindo já é uma agressão.

Na verdade, uma pessoa se uma pessoa disser apenas ‘eu não concordo com isso’, isso já pode ser considerado como uma agressão. Uma pessoa dizer apenas que você é bobo, já é uma agressão. Para haver uma agressão não importa quais palavras sejam proferidas ou com que intensidade e volume elas saiam, basta apenas não estar de acordo com as ideias de quem está ouvindo-as. Por isso é que Cristo ensina: “e quem chamar seu irmão de idiota estará em perigo de ir para o fogo do inferno” (Mateus, 5,22).

Vamos, portanto, tratar hoje daquelas conversas onde existem contrariedades entre o que é falado e as ideias daquele que está ouvindo. Mas, antes disso precisamos entender o que é um ser humano.

O que é um ser humano? Uma personalidade. O que quer dizer isso? Um conjunto de verdades, conceitos e informações. O ser humano é um conjunto de crenças… Por exemplo: sou homem, moro na cidade de São Paulo, vivo em determinado bairro, trabalho em determinada empresa, faço isso ou faço aquilo, reajo com nervosismo ou com calma, sou orgulho, sou vaidoso, etc. Esse conjunto de informações forma uma personalidade humana. O conjunto destas coisas forma uma personalidade humana.

Segundo detalhe sobre o ser humano: não existem dois seres humanos iguais, .ou seja, não existem duas personalidades que possuam o mesmo conjunto de verdades em gênero, número e grau.

É por isso quando duas personalidades ou seres humanos se encontram, sempre há um choque. Um choque de verdades, de hábitos, de costumes, temperamentos, de crenças. Este choque é inevitável porque se trata de um encontro de duas personalidades antagônicas, do encontro de dois seres que possuem um seu conjunto de verdades individuais.

Terceiro detalhe que precisa ser entendido para compreendermos o relacionamento de dois seres: todo ser humano por característica é egoísta!  Quando falo assim, eu não estou ofendendo ninguém. Não estou xingando nem brigando. Isso porque estou usando o termo egoísta como propriedade íntima de todo ser humano e não uma qualificação de determinados seres.

O que quer dizer ser egoísta? Pensar em si antes do outro, pensar a partir de si, de seu conjunto de verdades. Querer se sobrepor ao outro. Isso é ser egoísta. Ser egoísta é viver a partir de um eu, acreditando no eu e querendo que o eu tenha a palavra final da coisa.

Estou falando de processo mental. Ser egoísta é mentalmente acreditar apenas em si mesmo e querer que todos aceitem que o que o ser acredita está certo. Não estou falando de ações egoístas, pois o ato é prova e não vivência.

O processo mental de dois seres humanos quando estão frente a frente, conversando um com o outro, é realizado a partir das suas verdades, com a intenção de defendê-las e querendo que o outro compre estas verdades, ou seja, querendo que o outro desista da sua crença e acredite naquilo que o ser crê.

Pensando dessa forma, posso afirmar que quando você diz para uma pessoa que a laranja é um alimento gostoso todas as intencionalidades geradas pelo egoísmo estão presentes. Mas, e se o outro não gostar de laranja, como é que fica? Ele vai querer se defender, ou seja, vai querer defender o seu conjunto de verdades, pois também é um ser humano egoísta e quer que todos gostem do que ele gosta.

Quando ele fizer isso, estará lhe atacando? Eu diria que não. Ele estará se defendendo, pois foi você que o atacou quando disse uma coisa diferente do que ele pensa. Por isso ele dirá: ‘você está errado, laranja não é uma coisa gostosa, laranja não presta’

Quando o outro reage desta maneira, você, por conta do seu egoísmo, se sentirá agredido e irá querer também se defender. Para isso citará motivos que, ao seu entender, provam que laranja é uma fruta boa. Neste momento começa uma discussão com agressões de ambas as partes, ou seja, cada um irá expor suas razões, que por serem contrárias às dos outros, consistem-se numa agressão.

Essa é a forma humana de viver. É assim que todo ser humano vive. Este relacionamento pode não chegar às vias de fato a brigar, mas vai haver ali uma série de ataques e contra-ataques, pois cada um vai lutar para que a suaverdade prevaleça sobre a do outro..

O espiritualista reconhece o que acabamos de narrar como descrição de uma conversa e por isso, quando o outro diz que a laranja não é um alimento bom, ele não sente isso como uma agressão verbal, mas sim uma defesa dele ao seu argumento. Por isso, ao invés de preocupar-se em defender-se, o espiritualista encerra a discussão. Já o ser humano materialista, aquele que não vive para aproximar-se de Deus, não compreende e por isso insiste em querer provar ao outro que está certo.

Eis aí, portanto, a compreensão que pode levar o espiritualista a viver uma existência onde não perca jamais a sua paz e a sua harmonia com o mundo e com isso aproximar-se de Deus: ninguém ataca ninguém; todos se defendem de você.

Você já viu alguém ficar contrariado se o que você diz é o que ele pensa? Claro que não! O próximo só se sente contrariado e só rebate o que você fala, quando o que é dito ataca o que ele acredita.

Portanto, quando falamos sobre agressões verbais temos que compreender que ninguém lhe ataca de volta, mas apenas se defende de você. Faz isso porque não quer que a sua verdade perca, já que é egoísta por natureza.

Essa é uma compreensão importante para o espiritualista vivenciar acontecimentos deste mundo sem afastar-se de Deus: saber que no mundo, tudo e todos são personalidades individuais egoístas e por isso quando acontece uma contrariedade, se defendem de você. Sabendo disso, o espiritualista pode não vivenciar as relações onde existem ideias diferentes sem sentir-se magoado, infeliz ou atacado pelo outro.

Quando o espiritualista ouve o que o outro fala e tem a atenção plena ao que sua mente produz – que é um corrimão para a vivência espiritualista que já colocamos – ao invés de corroborar com o próximo ataque, que é uma nova defesa que a sua mente está armando, diz a si mesmo: ‘para, mente, não tenho que atacá-lo. Ele é um ser humano que tem o direito de acreditar em outra coisa’.

Eis aí, então, uma vivência específica que o ser humano que não busca a Deus vive de uma forma e o ser humano que busca vive de outra. Esse segundo ser jamais aceita a ideia de ter sido agredido verbalmente, pois sabe que o outro apenas se defendeu dele. Com isso, o ser espiritualista pode manter-se em paz, em felicidade e em harmonia. Com isso estará amando a deus sobre todas as coisas e o próximo como a si mesmo

Como disse no início dessa conversa, neste tema íamos fazer a aplicação dos corrimões que já estabelecemos para alcançar a vivência de um acontecimento específico. Apesar disso, estabelecemos com esta conversa mais um corrimão para que o espiritualista possa se apoiar na sua caminhada para aproximar-se de Deus: o mundo externo não lhe agride, mas apenas se defende de você.

Até agora já estabelecemos os seguintes corrimões: saber que a matéria não pode alterar a moral do espírito, saber que a fatalidade existe, utilizar-se da fé entregando-se à vida espiritual e viver com atenção plena em si mesmo e não no mundo externo. Hoje estabelecemos mais um: o mundo externo não lhe agride, mas está apenas se defendendo. Todos eles ainda serão usados muitas vezes e outros ainda serão estabelecidos nessa nossa conversa sobre a vivência do espiritualista.

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